18 mar 2025, ter

Descontaminando o debate econômico – 17/03/2025 – Opinião

Em artigos recentes na Folha, o colunista Marcos Mendes tem ignorado os numerosos resultados econômicos positivos dos últimos dois anos, como o crescimento acima das expectativas, o desemprego na mínima histórica e a inflação praticamente estável. A intenção do articulista, ao que parece, é construir uma narrativa em que a atual política econômica estaria promovendo a deterioração das contas públicas e o “desmonte do Plano Real”.

Em texto publicado em 21 de fevereiro, Mendes se vale da declaração do ministro Fernando Haddad, proferida em evento do FMI, de que uma “inflação entre 4% e 5% é algo relativamente normal para o Brasil desde o Plano Real” para concluir absurdamente que “o Ministério da Fazenda mina o sistema de metas de inflação”.

Vamos aos fatos: nos 26 anos de vigência do regime de metas de inflação, em 17 anos o IPCA terminou o ano acima de 5%; em seis anos, entre 4% e 5%; e apenas em três anos ficou abaixo de 4%. Falando para uma audiência internacional, em grande parte desconhecedora da realidade brasileira, o ministro utilizou dados e informações fidedignos e públicos. A partir do momento em que a afirmação de um fato comprovado se torna arma retórica contra o orador, atribuindo-lhe segundas intenções sem nenhum fundamento, estamos transferindo um debate sério para o campo da desinformação.

Algo similar se pode dizer das recentes colunas de Mendes acerca do resultado fiscal de 2024. Em seus textos, ele lançou mão de critérios “ad hoc” e desprovidos de amparo técnico para argumentar que o resultado primário recorrente (ou “déficit real”, como nomeia) de 2024 teria sido muito superior ao resultado oficialmente anunciado. Em apenas duas colunas, o economista Felipe Salto demonstrou cabalmente a forma “exótica” com que Mendes constrói seus argumentos, fazendo classificações sem critérios uniformes e confundindo conceitos básicos de Orçamento, como gasto primário e financeiro.

Essa confusão conceitual, no mínimo curiosa para alguém que se proclama especialista em finanças públicas, motivou nota pública do Ministério da Fazenda, em uma tentativa da pasta de corrigir as impropriedades de matérias baseadas nas análises de Mendes sobre os chamados “gastos parafiscais”.

Para fins de transparência, o colunista poderia lembrar a seus leitores de que atuou por quase três anos como assessor especial do Ministério da Fazenda no governo Michel Temer (2016-18). Nesse período (já excetuando 2016), o gasto primário do governo central alcançou seu maior nível da série histórica (excetuando 2020, ano da Covid), mantendo um patamar médio próximo a 19,4% do PIB. O resultado primário do governo central apresentou um déficit médio de 1,7% e o resultado primário estrutural da União foi crescentemente deficitário, como aponta recente estudo da Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda em parceria com consultores da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Os resultados fiscais ruins obtidos na gestão de Mendes são o avesso dos verificados na atual gestão fiscal. No segundo ano de governo, já é possível verificar a redução do gasto primário em proporção do PIB para 18,7%, a quase eliminação do déficit primário e a significativa melhoria do resultado fiscal estrutural.

Também seria importante lembrar aos leitores de que foi na gestão e sob a responsabilidade de Mendes e equipe que o STF julgou a “tese do século”, decisão com um impacto de aproximadamente R$ 1 trilhão, o que gera até os dias atuais uma perda de 1% do PIB ao ano na arrecadação bruta da União.

O debate público é o principal locus do esclarecimento em uma sociedade democrática. Equívocos podem ser cometidos, desde que reconhecidos e devidamente corrigidos. Por outro lado, quando a arena pública é contaminada por ideologias e utilizada para distorcer dados, conceitos e declarações, estamos às voltas com o universo das fake news, por mais que possuam uma aparência técnica elaborada.

TENDÊNCIAS / DEBATES

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