Todos os dias, bilhões de células em nosso corpo se dividem ou morrem. É tudo parte dos processos intrincados que mantêm o sangue fluindo do nosso coração, o alimento se movendo pelo nosso intestino e nossa pele se regenerando. De vez em quando, no entanto, algo dá errado, e células que deveriam parar de crescer ou morrer simplesmente não o fazem. Se não forem controladas, essas células podem se transformar em câncer.
A questão de quando e por que, exatamente, isso acontece —e o que pode ser feito para impedi-lo— há muito tempo intriga cientistas e médicos especializados em câncer. Apesar das perguntas sem resposta que permanecem, eles fizeram enormes avanços na compreensão e tratamento do câncer.
“Estamos muito menos receosos de dizer aos pacientes o que sabemos e o que não sabemos, porque sabemos muito mais”, diz George Demetri, vice-presidente sênior de terapias experimentais no Dana-Farber Cancer Institute em Boston.
A seguir estão algumas das maiores questões sobre o câncer que os cientistas começaram a responder.
Por que algumas mutações genéticas levam ao câncer enquanto outras não?
Os cientistas costumavam pensar que mutações genéticas —alterações na sequência de letras do seu DNA— eram a base de todos os cânceres.
Eles estavam apenas parcialmente certos. “As mutações são muito importantes —mas não são a explicação completa para um tumor”, diz Douglas Hanahan, do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer em Lausanne, Suíça. Algumas mutações permanecem dormentes durante toda a nossa vida, nunca levando ao câncer.
Agora está claro que, separadamente das mutações no DNA, existem outros fatores que alteram como os genes são expressos. Estas são chamadas de mudanças epigenéticas, e os cientistas descobriram que elas desempenham um papel enorme no desenvolvimento do câncer.
Os cientistas não entendem completamente o que leva a mudanças epigenéticas, mas envelhecimento, exposições dietéticas e ambientais, e inflamação crônica são todos considerados possíveis culpados.
A poluição pode causar câncer nas pessoas? E os microplásticos?
Os cientistas há muito sabem que alguns produtos químicos, como amianto e radônio, ou como aqueles na fumaça do cigarro e no álcool, podem causar câncer. Mas nos últimos anos, algumas pesquisas emergentes levantaram alarmes sobre os riscos da poluição do ar e dos microplásticos, e das substâncias per- e polifluoroalquil, ou PFAS.
“Existem sinais de que essas coisas podem ser cancerígenas, mas quais cânceres, quando e como é onde precisamos obter muito mais informações”, diz W. Kimryn Rathmell, ex-diretora do Instituto Nacional do Câncer.
A evidência é mais forte para a poluição do ar. Partículas finas, conhecidas como PM 2.5, têm mostrado aumentar o risco de câncer de pulmão e mama, afirma Loretta Erhunmwunsee, professora associada de cirurgia torácica na City of Hope, uma organização nacional de pesquisa e tratamento do câncer.
A quantidade de poluição à qual você foi exposto e por quanto tempo provavelmente importa. Pesquisas mostram que pessoas negras nos Estados Unidos são expostas a níveis desproporcionalmente altos de poluição do ar; elas também apresentam taxas mais altas de câncer de pulmão e de mortalidade pela doença em comparação com outros grupos raciais.
Agora entendemos que “o contexto social realmente impulsiona muitos dos resultados do câncer que vemos, e na verdade até mesmo o desenvolvimento e o próprio risco de câncer”, diz Erhunmwunsee.
Como a inflamação está relacionada a tudo isso?
Durante anos, os cientistas procuraram produtos químicos em nossas dietas e no ambiente que causassem mutações genéticas. Mas está se tornando claro que, se tais exposições afetam nosso risco de câncer, provavelmente o fazem provocando inflamação —não danificando diretamente o DNA, diz Robert Weinberg, professor de biologia no Instituto de Tecnologia de Massachusetts.
Veja o intestino: comer uma dieta não saudável pode desequilibrar nosso microbioma, permitindo que certas bactérias cresçam sem controle. Os cientistas acham que isso pode causar inflamação crônica, que pode levar a cânceres de cólon ou pâncreas, afirma Davendra Sohal, oncologista no Centro de Câncer da Universidade de Cincinnati, que se especializa em cânceres gastrointestinais.
A inflamação também pode promover o câncer em células que já sofreram mutação. As partículas PM 2.5, por exemplo, têm mostrado induzir inflamação nos pulmões, despertando células mutantes dormentes para alimentar a formação de tumores.
O que dá aos tumores o poder de crescer sem controle?
O câncer não é apenas um grupo de células anormais crescendo de uma maneira que não deveriam. Os cientistas agora reconhecem que os tumores são tecidos complexos compostos por células cancerígenas, bem como células normais que foram recrutadas para apoiar seu crescimento.
Muitas dessas células normais são do mesmo tipo de células imunológicas que inundam o local de uma lesão ou infecção para ajudar a curar essa ferida —ajudando novas células a se multiplicarem, gerando vasos sanguíneos, estimulando novo tecido conjuntivo e evitando ataques de outras partes do sistema imunológico. Estas são capacidades que as células cancerígenas podem cooptar indefinidamente para apoiar seu próprio crescimento.
“Os tumores são feridas que não cicatrizam”, diz Hanahan, citando uma observação que mudou paradigmas feita pela primeira vez na década de 1980 pelo patologista de Harvard Dr. Harold Dvorak.
Muito sobre como os tumores metastatizam —se espalham e se estabelecem em locais distantes— ainda permanece um mistério, afirma Kevin Cheung, do Fred Hutch Cancer Center em Seattle. Sua pesquisa mostrou recentemente que células mortas e moribundas dentro de um tumor podem criar um ambiente que facilita a saída e disseminação das células tumorais vivas. Outras pesquisas sugeriram que células imunológicas podem transferir seu conteúdo para células tumorais para torná-las mais invasivas.
Quais fatores de risco estão realmente sob nosso controle?
Muitos cânceres se formam por razões que estão completamente fora de nosso controle. “Sempre haverá alguns cânceres, mesmo se tivéssemos a melhor prevenção”, diz Rathmell. Mas a prevenção pode fazer uma grande diferença.
Epidemiologistas agora estimam que 40% dos cânceres, e uma parcela semelhante de mortes por câncer, podem ser atribuídos a fatores de risco que as pessoas podem abordar. O maior deles é o tabagismo, mas a lista também inclui exposição ao sol, uso de álcool e excesso de peso corporal.
Algumas infecções, incluindo aquelas causadas pelos vírus da hepatite B e C, pelo papilomavírus humano e pela bactéria H. pylori, também podem causar certos cânceres. Vacinar-se contra o HPV e fazer exames para hepatite e H. pylori pode reduzir o risco.
O câncer é curável?
Embora as pessoas possam pensar em um câncer como “curado” uma vez que alguém está em remissão, os médicos historicamente têm sido relutantes em prometer que poderiam eliminar completamente o câncer de uma pessoa. “Nunca ousamos usar a palavra ‘cura'”, diz Marcel van den Brink, presidente do City of Hope National Medical Center. Mas tratamentos mais novos, como transplantes de células-tronco e CAR-T, deram a ele e a outros médicos mais esperança.
“Houve uma mudança radical de, ‘Você vai morrer deste câncer’, para, ‘Temos uma lista de terapias disponíveis e empolgantes que vamos explorar'”, diz Rathmell.
Mesmo sem evidência de doença, alguns cânceres podem voltar —e nesses casos, os médicos são mais cautelosos sobre os resultados potenciais.
Ainda assim, há razão para otimismo. As taxas de mortalidade por câncer despencaram nos últimos 30 anos. Agora temos medicamentos que visam genes causadores de câncer que há muito tempo eram considerados impossíveis de tratar.
Certos cânceres costumavam ser “sentenças de morte”, afirma Sohal. Agora eles são mais parecidos com diabetes, uma doença complicada que pode ser tratada com efeitos colaterais gerenciáveis: “As pessoas vivem com a doença por muito tempo”, diz ele.