17 mar 2025, seg

Versão humana de gene altera som produzido por camundongos – 28/02/2025 – Ciência

Há muito tempo, cientistas tentam entender como a linguagem humana evoluiu. Palavras e frases não deixam fósseis para os paleontólogos desenterrarem. Mas um estudo publicado no último dia 18 no periódico Nature Communications oferece uma nova pista importante.

Pesquisadores descobriram que, entre 250 mil e 500 mil anos atrás, um gene conhecido como NOVA1 passou por uma mudança evolutiva profunda em nossos ancestrais.

Quando os cientistas inseriram a versão humana desse gene em camundongos, os animais produziram sons mais complexos.

O neurocientista Erich Jarvis, da Universidade Rockefeller, alertou que o NOVA1 sozinho não acionou repentinamente as habilidades linguísticas de nossos ancestrais. “Eu não diria que é ‘o’ gene da linguagem”, afirmou ele, que é coautor do novo estudo.

A linguagem surgiu graças a mutações em centenas de genes ao longo de milhões de anos. “Mas onde o NOVA1 se encaixa nessa combinação toda? É uma das últimas etapas”, disse Jarvis.

O NOVA1 chamou a atenção em 2012 quando apareceu em uma lista de genes que produziam proteínas idênticas na maioria dos mamíferos, mas produziam uma forma diferente em humanos. Dos mais de 20 mil genes codificadores de proteínas, 23 entraram na lista. Todos provavelmente foram cruciais para a evolução de nossa espécie.

A inclusão do NOVA1 na lista surpreendeu o neurocientista Robert Darnell, da Universidade Rockefeller, responsável pela descoberta do gene em 1993. Ele ficou surpreso porque o gene parece ser essencial para todos os mamíferos. Um roedor modificado sem o NOVA1 morrerá durante o desenvolvimento. Nada na pesquisa de Darnell havia sugerido que o gene desempenhasse um papel distinto na evolução humana.

Darnell começou a colaborar com biólogos evolutivos para descobrir mais. Um deles, Adam Siepel, do Laboratório Cold Spring Harbor, em Nova York, liderou um esforço para reconstruir a história do NOVA1. Ele analisou a sequência do gene no DNA de humanos extintos, bem como informações genéticas de mais de 650 mil pessoas vivas.



O emocionante sobre o NOVA1 é que agora há mais um jogador na partida

Siepel descobriu que o NOVA1 passou por uma profunda mudança logo após nossos ancestrais se separarem dos neandertais e dos denisovanos, proporcionando uma vantagem evolutiva aos primeiros humanos que herdaram a mudança. No fim, a versão evoluída substituiu a original.

Desde então, segundo Siepel, essa versão modificada do gene se manteve dominante na população humana. As mutações que revertiam o NOVA1 para sua forma original devem ter sido prejudiciais, pois são extremamente raras. Das 650 mil pessoas registradas no banco de dados, 6 carregavam a versão original do gene.

Os pesquisadores não sabem nada sobre quem são essas seis pessoas. Darnell está agora procurando portadores do NOVA1 original, na esperança de testá-los quanto às habilidades de fala.

Enquanto isso, Darnell e seus colegas criaram camundongos que carregam a versão humana do NOVA1, em vez da encontrada em outros mamíferos. Aparentemente, os camundongos com essa versão do gene pareciam comuns. Contudo eles tinham algumas diferenças.

A versão humana do NOVA1 supervisionou a produção de 200 proteínas nos cérebros de roedores, algo que a versão comum do gene não fez. E muitas dessas proteínas desempenharam um papel em como os animais produzem sons.

“Para mim, isso foi como ‘bingo!'”, disse Darnell.

Se o NOVA1 tivesse moldado a evolução da linguagem humana, Darnell pensou, então a versão humana dele poderia mudar a forma como os camundongos produzem sons. Jarvis, especialista em vocalização animal, ajudou Darnell a escutar os animais.

Os camundongos normalmente produzem pulsos de guinchos ultrassônicos que se assemelham a sílabas na linguagem humana. Mas os animais que carregavam a versão humana do NOVA1 emitiam guinchos peculiares, descobriram os cientistas. A diferença era especialmente notável quando os machos cantavam canções de cortejo para as fêmeas. Suas canções continham sons mais complexos, e os roedores alternavam entre esses sons em padrões mais intrincados.

As mudanças na evolução do NOVA1 ocorreram depois que nossos ancestrais se separaram dos neandertais e denisovanos. No entanto, outro gene da linguagem, o FOXP2, passou por uma série de mudanças importantes antes dessa separação. E estudos mostraram que camundongos que carregam genes humanos FOXP2 também emitem guinchos estranhos.

Alguns cientistas especularam que os dois genes alteraram independentemente regiões do cérebro humano que produzem sons complexos.

“O emocionante sobre o NOVA1 é que agora há mais um jogador na partida”, disse Wolfgang Enard, geneticista da Universidade Ludwig Maximilian de Munique que trabalhou nos camundongos FOXP2.

Jarvis disse acreditar que o ancestral comum dos humanos modernos, neandertais e denisovanos poderia falar, talvez graças a genes como o FOXP2. Mas mutações em outros genes, incluindo o NOVA1, podem ter dotado apenas os humanos modernos com a capacidade de produzir uma gama mais ampla de sons complexos, expandindo o poder da linguagem.

Para testar essa hipótese, Jarvis espera criar roedores com mutações no NOVA1, FOXP2 e outros genes que podem ter sido importantes no surgimento da linguagem. Juntas, essas mutações podem permitir que os camundongos produzam chamados ainda mais complexos.

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