Após semanas de articulação política e intensas negociações nos bastidores, o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, enfim homologou um acordo com o Congresso Nacional para liberar as emendas parlamentares.
Mas não todas. Continuam vetados repasses a ONGs e entidades do terceiro setor reprovadas em auditoria da Controladoria-Geral da União. Além disso, transferências diretas para Estados e municípios, conhecidas como emendas Pix, só poderão ser pagas mediante a apresentação de planos de trabalho.
Com a decisão, que precisa ser referendada pelo plenário, dá-se um passo importante para encerrar, ou pelo menos amenizar, os atritos entre Legislativo e Judiciário, em uma disputa na qual o Congresso jamais teve razão.
Emendas parlamentares têm sua razão de ser. Em doses moderadas, elas ajudam a descentralizar o Orçamento público, ao permitir a destinação de recursos para demandas locais quase sempre ignoradas pelo governo federal.
O problema é que, nos últimos anos, o volume das emendas atingiu patamares incompatíveis com a racionalidade administrativa. Em 2019, elas não alcançavam 8% das despesas discricionárias (não obrigatórias); em 2024, saltaram para alarmantes 19,5% —foram quase R$ 45 bilhões de um total de R$ 230 bilhões.
Costuma-se dizer que, na política, não existe vácuo de poder. Pois a trajetória das emendas reforça essa tese. O Congresso aproveitou a fragilidade do governo de Jair Bolsonaro (PL) para abocanhar fatias crescentes de recursos da União; Luiz Inácio Lula da Silva (PT), também sem base sólida, manteve o mesmo padrão.
O resultado foi lamentável para o país, e por mais de um motivo. O simples sequestro de parcelas cada vez maiores do dinheiro é um deles, já que as emendas, agora, têm dimensão suficiente para comprometer políticas públicas.
Há mais, porém. Do jeito que vinham sendo feitas, as transferências representavam gastos de péssima qualidade, uma vez que careciam de transparência, planejamento e eficiência —violando, portanto, diretrizes inscritas na própria Constituição Federal.
Isso para nada dizer das inúmeras suspeitas de malversação das verbas —órgãos de controle investigam irregularidades que teriam sido cometidas por políticos de diferentes posições.
Em uma estratégia conhecida, ao se verem na mira da Polícia Federal, parlamentares afirmaram que o STF invadia a competência do Legislativo. O Judiciário de fato incide com frequência nesse pecado, mas não dessa vez.
As ações do ministro Dino —e o acordo agora homologado é mais uma delas— têm o condão de restaurar princípios da administração pública que vinham sendo desrespeitados de forma sistemática. A separação entre os Poderes, afinal, não pode se converter em salvo-conduto para que deputados e senadores dilapidem o Orçamento da União, já tão deficitário.