17 mar 2025, seg

Ansiolíticos e calmantes: entenda os riscos do vício – 16/03/2025 – Equilíbrio

Victoria Ratliff, personagem da terceira temporada da série “The White Lotus”, tem um problema: ela continua tomando comprimidos. E a droga escolhida, o medicamento ansiolítico lorazepam, a deixou um pouco desorientada.

No programa, que acompanha hóspedes em férias em um resort fictício, Victoria combina sua medicação com vinho, o que a leva a cochilar à mesa de jantar. Às vezes também fala arrastado.

Quando percebe que seu estoque de comprimidos está misteriosamente diminuindo, ela pergunta aos filhos se os estão roubando.

“Você não tem lorazepam suficiente para passar uma semana em um spa de bem-estar?”, pergunta sua filha, Piper.

“The White Lotus” não é o único programa a apresentar recentemente essas drogas. A nova série da Max, “The Pitt”, que se passa em um departamento de emergência, inclui uma trama sobre um benzodiazepínico chamado Librium.

Não se trata de Hollywood tomando liberdades dramáticas. Benzodiazepínicos como lorazepam e clordiazepóxido são notórios por terem o potencial de serem altamente viciantes. Também podem provocar sintomas de abstinência difíceis —às vezes fatais.

O uso indevido de benzodiazepínicos não é incomum, diz Ian C. Neel, geriatra da UC San Diego Health. “Definitivamente vemos isso muito na vida real também.”

Segundo ele, nos últimos anos estudos mostraram que este é um problema maior do que os médicos inicialmente perceberam.

Coleção de drogas mal utilizada

Frequentemente chamadas de benzos ou calmantes, as drogas são comumente usadas para tratar ansiedade, ataques de pânico e distúrbios do sono como a síndrome das pernas inquietas. Mas também podem ser usadas por outros motivos, como ajudar pessoas a gerenciar a abstinência de álcool.

Outros benzodiazepínicos comuns incluem diazepam (Valium), clonazepam (Klonopin) e alprazolam (Xanax).

Ao contrário dos antidepressivos, que podem levar semanas para começar a funcionar, a maioria dos benzodiazepínicos pode proporcionar alívio em minutos —o que pode confortar passageiros nervosos e outros que precisam de alívio rápido da ansiedade para uma situação específica. Mas, se tomados por períodos mais longos, os pacientes podem desenvolver tolerância em semanas após o início do uso, mesmo quando consumidos conforme prescrito, diz Ludmila De Faria, presidente do conselho de saúde mental das mulheres da Associação Psiquiátrica Americana.

“É aí que as pessoas se metem em problemas”, ela afirma, sobre tomar mais do medicamento. “A mesma dose não eliminará mais os sintomas.”

Além disso, drogas como clonazepam e diazepam permanecem mais tempo no corpo do que drogas de ação curta como alprazolam. “As pessoas não percebem isso”, diz. “Então tomam múltiplas doses, e isso se acumula”, o que pode resultar em pessoas “andando por aí como se tivessem tomado algumas bebidas”.

Todos esses fatores combinados levaram ao uso indevido generalizado dessas drogas. Em 2019, os dados mais recentes disponíveis, as farmácias dispensaram cerca de 92 milhões de prescrições de benzodiazepínicos, de acordo com a FDA (Food and Drug Administration, agência reguladora dos EUA). Pesquisas sugerem que as drogas são prescritas com mais frequência para adultos entre 50 e 64 anos.

Delírio, quedas e outros riscos

Em 2020, a FDA atualizou as informações fornecidas a prescritores e pacientes para todos os benzodiazepínicos para alertar sobre os riscos de dependência física, reações de abstinência, uso indevido, abuso e vício.

Idealmente, esses perigos são explicados a um paciente antes de tomar o primeiro comprimido. Mas isso nem sempre acontece. E mesmo que um paciente receba aconselhamento adequado, “é uma coisa dizer, e outra coisa experimentar”, diz Neel.

Ele afirma que frequentemente vê pacientes que já estão tomando um coquetel de outros medicamentos e não entendem os perigos de combinar benzodiazepínicos, que são depressores, com outras drogas que também têm efeitos sedativos, como medicamentos para dormir ou Benadryl.

E se você vai beber álcool ou usar Cannabis, é melhor não ter nenhum benzodiazepínico no seu organismo. Quando as pessoas combinam substâncias que têm efeito depressor, isso pode interferir até mesmo na respiração.

A população geriátrica que Neel trata é especialmente vulnerável porque os benzodiazepínicos são metabolizados de forma diferente à medida que envelhecemos, ele afirma, permanecendo no corpo por um período mais longo. Como resultado, pessoas mais velhas que os consomem podem estar mais propensas a quedas ou acidentes de carro, por exemplo. As drogas também podem causar delírio em pacientes com demência.

Esses medicamentos, contudo, podem ser perigosos para pessoas de qualquer idade, razão pela qual são tipicamente prescritos por um curto período de tempo —geralmente quatro semanas ou menos— e são considerados um último recurso para tratar uma condição crônica, acrescenta Neel.

Processo de abstinência delicado

Um estudo de 2019 descobriu que quase 20% das pessoas que tomam benzodiazepínicos os usam de forma inadequada. Se alguém desenvolve dependência, parar pode ser difícil, em parte por causa dos intensos sintomas de abstinência.

Esses sintomas podem incluir distúrbios do sono, irritabilidade, sudorese, palpitações cardíacas, pressão arterial elevada e problemas estomacais como ânsia de vômito.

A redução gradual do medicamento precisa ser feita de forma suave, idealmente sob a supervisão de um médico.

É “quase como pousar um avião, onde há uma descida gradual”, afirma John Torous, psiquiatra do Beth Israel Deaconess Medical Center em Boston.

Enquanto isso acontece, ele acrescentou, o paciente pode tentar diferentes métodos para dormir mais e conversar com um terapeuta sobre estratégias para ajudar a gerenciar a ansiedade.

Além disso, existem outros medicamentos, como a clonidina, que podem ser usados para tratar a ansiedade e também ajudar com sintomas de abstinência.

No final, é sempre mais eficaz tentar identificar e abordar a causa raiz da ansiedade, afirma Torous. “Os benzos estão proporcionando alívio rápido no cérebro, mas um dia eles desaparecem, esse alívio rápido se vai.”

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