Até agora a mais procedente ação da política externa de Donald Trump em termos de resultados, a ofensiva para pôr fim à Guerra da Ucrânia chegou nesta semana a um ponto de inflexão, que pode definir o destino do mais trágico conflito europeu desde 1945.
Em menos de dois meses, o presidente americano operou uma diplomacia de vaivéns atordoantes, deixando Moscou e Kiev desconfiados, cada uma a seu tempo.
Começou se alinhando a Vladimir Putin, trazendo o Kremlin para uma negociação bilateral baseada na controversa narrativa russa sobre a origem da guerra.
Dali decorreram cenas lamentáveis, como a admoestação pública de Volodimir Zelenski na Casa Branca, e o corte da ajuda militar dos EUA aos ucranianos.
Fiel à sua propalada tática negocial, o republicano então buscou abrir a porta a Kiev, pedindo em troca a aceitação de um cessar-fogo de 30 dias. Deu certo, e o fluxo de armas e de imagens de satélite foi restabelecido.
Movimento que desagradou Putin. Ante o coloquial “a bola está na sua quadra” enunciado por Trump, o autocrata russo devolveu dizendo que aceita a trégua, mas apenas se os termos da negociação de paz já estiverem claros.
Em outras palavras, os seus termos: neutralidade ucraniana, desarmamento do país e a cessão final dos cerca de 20% do território que controla do vizinho. A Casa Branca parece inclinada a aceitar o pacote e restará pouco a Kiev a não ser fazer o mesmo. Contudo há um inventário de óbices a ser examinado antes.
O mais espinhoso é a questão das garantias de segurança para a manutenção da paz. A Rússia afirma que sua palavra basta, mas os EUA e a Ucrânia querem uma força estrangeira para esse fim no local, europeia de preferência, o que Moscou rejeita.
Afinal, um dos motivos alegados por Putin para invadir o vizinho em 2022 foi justamente o risco de as forças da Otan, a aliança militar do Ocidente, ficarem ainda mais próximas com uma possível adesão da Ucrânia.
Esse assunto é um lembrete de como a guerra, por mais que termine favorável a Putin, também representa uma derrota estratégica do russo. Ele fracassou em dobrar um país mais frágil em poucas semanas, como era esperado até no Ocidente.
Ademais, viu sua fronteira seca com a Otan duplicar de tamanho, com a adesão da Finlândia devido ao discutível temor de que a Rússia não vai parar na Ucrânia. Por fim, há a fraqueza exposta pela necessidade do fim das sanções que ameaçam no longo prazo a economia de seu país.
Isso dito, a dura negociação é hoje a melhor chance para a matança acabar, o que justifica o otimismo cauteloso expresso em Moscou e Washington.
O risco, ainda inescrutável, é que Trump pode passar à história como uma versão caricata de Neville Chamberlain, o premiê britânico que vendeu terras alheias para comprar um ano de paz inútil com Adolf Hitler em 1938.