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Corte de ajuda dos EUA afeta saúde e veteranos na Ucrânia – 19/03/2025 – Mundo

“O financiamento do seu projeto não se alinha às prioridades da agência” e “esse programa não é do interesse nacional”, dizia o email seco enviado pela Usaid, a agência de ajuda externa dos Estados Unidos que foi fechada por Donald Trump. “Deus abençoe a América”, concluía a mensagem de 27 de fevereiro recebida por Olga Aivazovska, diretora do conselho da ONG ucraniana Opora.

O financiamento cortado pela Usaid, de US$ 8 milhões, era justamente para algo que tem sido apresentado como prioridade por Trump —organização das próximas eleições na Ucrânia. Mas nem isso poupou o projeto da motosserra de Elon Musk, que, à frente do Doge, ainda que não oficialmente, cortou quase toda a ajuda que os EUA davam a outros países.

A Ucrânia é o maior receptor de recursos da Usaid —foram US$ 28 bilhões em 2023. Em segundo lugar, vem a Jordânia, com US$ 1,6 bilhão, e o Egito, com US$ 1,5 bilhão.

Segundo o secretário de Estado americano, Marco Rubio, 83% dos 6.200 contratos da Usaid foram cancelados. “Os 5.200 contratos que agora estão cancelados representaram gastos de dezenas de bilhões de dólares que não serviam, e às vezes até prejudicavam, os principais interesses nacionais dos Estados Unidos”, disse ele no X.

O projeto cortado da Opora era para organizar uma missão de observadores para assegurar eleições justas na Ucrânia após o fim da lei marcial no país, vigente desde a invasão russa.

“Precisaremos apoiar a democracia na Ucrânia sem ajuda dos EUA”, diz Aivazovska. Ela agora está buscando financiamento do Reino Unido e da Noruega para tentar tapar o buraco deixado por Washington.

Trump tem afirmado que os EUA já destinaram US$ 350 bilhões em ajuda externa (militar e não militar) à Ucrânia desde o início da guerra e que a Europa só deu US$ 100 bilhões. Os números não estão corretos. Segundo o Instituto Kiel para a Economia Mundial, os EUA destinaram US$ 119 bilhões de ajuda direta para a Ucrânia, e os países europeus, US$ 138 bilhões. Os números são corroborados por outros levantamentos.

No Centro Ucraniano de Assistência à Saúde, apenas 5% do orçamento vinha da Usaid. Mas mesmo quem não dependia tanto dos recursos da agência americana está sofrendo, porque aumentou muito a competição por financiamento de outros países.

A Usaid financiava um programa em que o centro estava aprimorando o atendimento básico a saúde em dez comunidades. Nesses locais próximos do front, não há grandes hospitais, e o transporte público não está funcionando. Então essas unidades básicas de saúde precisam oferecer atendimento completo. O centro estava treinando profissionais para prestarem atendimento de emergência e cuidados a pacientes em estado crítico.

“Tivemos que fechar tudo, no meio do projeto. Com isso, essas comunidades no front vão ficar sem um bom atendimento de emergência”, diz Irina Nemirovitch, diretora executiva do órgão.

Outro financiamento cortado foi o da Fundação Vesta, que oferece assistência psicológica a soldados e veteranos. Estresse pós-traumático, membros amputados, readaptação à vida civil e depressão são alguns dos problemas comuns entre os militares ucranianos.

A fundação tem 12 psicólogos em tempo integral e mais 13 para períodos de crise que oferecem consultas online e no front. O programa dependia de doações de empresas, indivíduos e dos EUA. Agora, está buscando novas fontes, diz Vladislav Babir, vice-diretor da fundação. O Ministério de Veteranos da Ucrânia também dependia de financiamento da Usaid e anunciou que vai acabar em abril com a linha de emergência criada para prevenção de suicídios.

O corte na ajuda financeira, a proximidade com o líder da Rússia, Vladimir Putin, e o bate-boca com o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, no Salão Oval, tem reverberado entre a população da Ucrânia.

“Trump tem problemas psicológicos. Não acredito no que ele fala, e não acredito que as negociações de paz vão dar certo”, disse a psicóloga Marharita Ribtchenko, que perdeu seu apartamento em Kiev em um bombardeio russo no ano passado que matou 14 pessoas do prédio.

A repórter viajou à Ucrânia a convite da ONG Public Interest Journalism Lab.

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