A decisão do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) de se licenciar do cargo para permanecer nos Estados Unidos fez com que ganhasse de parlamentares bolsonaristas o status de “exilado político” e manifestações de solidariedade.
Por outro lado, integrantes do governo Lula (PT) e parlamentares de esquerda viram no gesto uma tentativa de vitimização e de difamação do país no exterior.
Eduardo anunciou, na manhã desta terça-feira (18), que continuaria nos EUA com sua família, onde já tem passado boa parte do ano, numa cruzada para convencer a administração de Donald Trump a aplicar sanções a ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), sobretudo, Alexandre de Moraes.
Deputados, senadores e dirigentes de partidos avaliam que a decisão de Eduardo cria um fato político importante para reforçar argumentos dele junto aos americanos. Entre eles, há uma expectativa de que haja algum tipo de retaliação ao Supremo.
Em outra frente, nacionalmente, Eduardo reforça a tentativa de se apresentar como perseguido político –à Folha o deputado disse ainda considerar pedir asilo ao país.
Apesar do tom com que comunicou sua saída do país, ele não está implicado nas principais suspeitas que pesam sobre o seu pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Não foi, por exemplo, indiciado no caso da trama golpista nem foi alvo em investigações como a das joias presenteadas pela Arábia Saudita.
No Senado, onde visitou uma exposição sobre o Holocausto, o ex-presidente Bolsonaro disse a jornalistas estar orgulhoso do filho, que “se afasta para combater algo parecido com o nazifascismo, que cada vez mais avança em nosso país”.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que discursou em ato bolsonarista no domingo (16), manifestou em rede social endosso ao aliado: “Força, @bolsonarosp ! Conte sempre com meu apoio.”
Já o líder da oposição na Câmara, Zucco (PL-RS), falou em denunciar “parcialidade” no país.
“[Eduardo] está assumindo uma missão histórica: levar ao mundo a verdade sobre o estado de exceção imposto no Brasil, onde a direita tem sido perseguida e tratada com desmedida parcialidade. Seu trabalho no exterior será fundamental para denunciar os abusos e garantir que os valores democráticos sejam preservados”, afirmou.
A decisão do deputado foi anunciada em vídeo publicado nas suas redes sociais no final da manhã e causou surpresa em aliados e integrantes do partido. Segundo relatos, nem mesmo o seu irmão, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), foi avisado com antecedência.
O principal argumento para anunciar sua permanência nos Estados Unidos era a possibilidade de apreensão do seu passaporte. Os deputados Rogério Corrêa (PT-MG) e Lindbergh Farias (PT-RJ) tinham apresentado uma queixa-crime, em fevereiro, alegando que o adversário teria atuado contra a soberania brasileira e pedindo a apreensão do documento.
Moraes pediu manifestação da PGR, em 5 de março, e a resposta chegou nesta terça-feira, após o anúncio de Eduardo. O parecer de Paulo Gonet, procurador-geral da República, foi contrário e, ato contínuo, o magistrado arquivou o pedido do PT.
Ainda assim, segundo aliados de Eduardo, ele continuará nos Estados Unidos, por ainda temer uma mudança de postura de Moraes.
A medida do PT ocorreu em meio à sinalização do PL de que indicaria Eduardo para presidir a Comissão de Relações Exteriores da Casa, onde prometia reforçar a atuação contra o governo e o STF.
Segundo relatos, ministros do Supremo se mobilizaram contra essa possibilidade. Integrantes da corte chegaram a ligar para dirigentes do PL e para o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Agora, ocupará o posto o deputado Filipe Barros (PL-PR).
O gesto de Eduardo foi criticado por integrantes do governo, que viram tentativa de vitimização. A ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT), classificou, nas redes sociais, como uma fuga, “mais uma encenação desesperada da família golpista e seus cúmplices”. “Querem se passar por vítimas e difamam o Brasil, de forma criminosa, mentindo que vivemos numa ditadura. Quem tramou um golpe e até assassinatos para usurpar o poder foram eles”, publicou ela.
Ao lembrar a depredação das sedes dos três Poderes, Gleisi rechaçou a ideia de perseguição política dos apoiadores de Bolsonaro. “Não foi Disneylândia, foram atentados violentos às sedes dos Poderes. Não é perseguição, é o devido processo legal em andamento. E não será mentindo que vão se livrar de um encontro com Justiça, cada vez mais próximo”, acrescentou.
Líder do PT na Câmara dos Deputados, Lindbergh Farias afirmou que o filho de Bolsonaro “está numa luta fora do país para constranger o Supremo”, em uma luta cotidiana.
Ele disse ainda que é a quarta vez que Eduardo Bolsonaro vai aos EUA desde a eleição de Trump. Lindbergh disse que questionou por que recebeu salário da Câmara estando no exterior.
Ainda segundo o petista, o deputado do PL temia a apreensão do passaporte, o que impediria sua articulação internacional. “Ele é um elemento que está tentando intrigar o tempo inteiro o governo norte-americano com o governo brasileiro. Você sabe que o Lula está com o maior cálculo, o maior cuidado, ele fica lá o tempo inteiro vendendo essas coisas maluquíssimas, que não há democracia aqui”, disse o líder do PT.
Na avaliação de integrantes do governo, Eduardo pretende ainda ganhar visibilidade para se projetar eleitoralmente para 2026.
CRÍTICAS
Em entrevista à revista Oeste também nesta terça, o filho do ex-presidente disse que “Alexandre não vai conseguir sequer ter um cartão Visa ou Mastercard para comprar uma blusinha da Shein”, em referência à possibilidade de sanções dos Estados Unidos contra o magistrado.
Eduardo afirmou que a decisão de Gonet dada justamente nesta terça, quando o deputado anunciou que não voltaria ao Brasil, é exemplo de “cálculo político” feito pelo Judiciário.
Segundo ele, a repercussão a seu anúncio “veio forte”, e a PGR decidiu dar a decisão para “aliviar a pressão”. “Isso não me deixa tranquilo para retornar ao Brasil”, afirmou.
Na entrevista, Eduardo e o pai também falaram sobre articulações no Congresso. Bolsonaro citou uma proposta do senador Magno Malta (PL-ES) na qual a inelegibilidade de parlamentares seria votada pelas respectivas Casas a fim de evitar que a medida continue sendo um “instrumento político do TSE [Tribunal Superior Eleitoral]”.
“Acabam tirando do páreo quem eles querem tirar”, afirmou o ex-presidente.
Segundo Eduardo, Hugo Motta demonstrou preocupação em relação à sua situação, embora não publicamente.