Na UVIS São Miguel (Unidade de Vigilância em Saúde), em São Miguel Paulista, na zona leste de São Paulo, os funcionários pagaram do próprio bolso para comprar ventiladores e enfrentar o calor que tem atingido a cidade.
Em fevereiro, dois servidores do centro de saúde teriam se afastado após passarem mal por causa das altas temperaturas. “A cabeça gira. A visão fica turva. Você torra”, diz uma funcionária que pediu anonimato.
Segundo os servidores da UVIS São Miguel, que preferem não se identificar, não há previsão de instalação de ar-condicionado no local —além de o elevador ter quebrado, o que força os agentes de saúde terem que subir e descer escadas. Com um termômetro próprio, eles chegaram a registrar 42ºC em fevereiro.
O calor intenso em hospitais, UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) e UBSs (Unidades Básicas de Saúde) vem afetando o trabalho de servidores da saúde e pacientes na capital paulista.
Desde dezembro, a prefeitura tem sido notificada pelo Sindsep (Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo) com pedidos de ar-condicionado, ventiladores, pontos de hidratação e até protetores solares para agentes de saúde. A última reivindicação foi no dia 21 de fevereiro, quando a temperatura ultrapassou os 30ºC na cidade.
As UVIS atendem a população que procura vacinação antirrábica para cães e gatos, fazem fiscalização de alimentos e medicamentos e controle de vetores de doenças, como o mosquito da dengue, entre outras ações.
A Folha usou um termômetro para aferir o calor no Hospital Municipal Tide Setubal, também em São Miguel Paulista, e no Professor Doutor Alípio Corrêa Netto, em Ermelino Matarazzo, na zona leste, na última quarta (26), entre 11h e 13h, horário de calor intenso.
Na área de atendimento a pacientes, as temperaturas nos dois locais ultrapassaram os 32ºC. Segundo funcionários, o calor é ainda mais forte nos ambientes internos dos hospitais.
“É um inferno”, diz uma servidora do Tide Setubal. Lá, os funcionários também compraram ventiladores portáteis como o próprio dinheiro.
No centro de saúde de São Miguel, a prefeitura instalou ventiladores fixos nas paredes. Os aparelhos, porém, são um empréstimo.
Em nota, a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) afirma que “tem realizado adequações nas unidades de saúde citadas e em demais equipamentos, com objetivo de melhorar ainda mais a climatização e o bem-estar de pacientes e colaboradores”.
A SMS diz em nota que os “hospitais Municipais Tide Setúbal e Prof. Dr. Alípio Corrêa Netto (Ermelino Matarazzo) passam por uma reforma de ampliação das instalações, inclusive de leitos, além da melhoria do sistema de climatização. As adequações são realizadas de forma gradativa e vão proporcionar mais conforto a profissionais e pacientes das unidades”.
O pedido do Sindsep feito à prefeitura está dentro do Plano de Ação Climática do Município de São Paulo, que estabelece desconforto térmico em temperaturas acima dos 27ºC.
“Limites a partir dos quais aumenta significativamente o risco de morte”, argumentaram os líderes sindicais à prefeitura. Na UPA da Lapa, na zona oeste, funcionários também relatam pacientes passando mal com os termômetros acima dos 30ºC. Segundo a prefeitura, “a capacidade do ar-condicionado está sendo ampliada” após reformas.
Em um centro de controle epidemiológico em Ermelino Matarazzo, servidores também atendem a população em um subsolo, sem janelas ou ventilação, segundo um servidor. Um pedido de ar-condicionado teria sido feito à prefeitura mas, de acordo com o servidor, a administração alegou falta de verba e problemas estruturais no prédio alugado.
“A gente cozinha lá dentro”, diz um servidor, que pede para não ser identificado por medo de represálias administrativas.
O chamado estresse ou desconforto térmico acontece quando o corpo transpira em excesso e desidrata para tentar equilibrar o calor interno e externo. Os efeitos são queda de pressão, náuseas, confusão mental, câimbras, tontura e até morte.
Uma nota técnica do Ministério da Saúde, de 2017, inclui os espaços de saúde como vulneráveis ao calor, devido ao acréscimo diário de novas pessoas no mesmo espaço durante os atendimentos.
O mês de fevereiro foi marcado por dias com mais de 30°C na capital paulista, ultrapassando a média climatológica para o mês, que é de 29°C, segundo o Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia).
A SMS afirma que sempre que a temperatura ou sensação térmica atinge 32ºC na cidade, a prefeitura ativa a Operação Altas Temperaturas, atendendo a população em dez tendas montadas em pontos estratégicos de São Paulo e acolhendo pessoas que queiram um abrigo para descansar e se hidratar.
“Os cidadãos têm acesso a água, chás, sucos gelados e frutas. As tendas também contam com espaço para atendimento e orientação quanto aos cuidados necessários com os animais em dias de calor intenso”, diz em nota.