O ministro Mauro Campbell Marques, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), assumiu em setembro de 2024 o cargo de corregedor no Conselho Nacional de Justiça, mas uma de suas recentes decisões sugere que ele talvez não tenha atinado com a importância de sua função.
Cabe ao CNJ, nos termos da Constituição, exercer o controle da atuação administrativa e financeira do Judiciário, e seria de esperar que o corregedor do órgão fosse o primeiro a dar o exemplo ao se deparar com manobras destinadas a burlar os limites legais e liberar regalias.
Pois Campbell Marques teve uma boa oportunidade ao julgar um caso do Tribunal de Justiça de Sergipe. A discussão de fundo dizia respeito ao pagamento de verbas retroativas referentes a um adicional por tempo de serviço.
Seria possível debater miudezas quanto à adequação do penduricalho e quanto à competência da corte local para autorizá-la; não sendo ciência exata, o direito reconhece como natural o choque entre argumentos em torno de certos aspectos da legislação.
O que ainda assim nunca esteve em debate, contudo, é a necessidade de que qualquer pessoa, e os magistrados antes das demais, respeite os mandamentos objetivos contidos na Constituição.
Um deles está no artigo 37 e versa sobre o vencimento mensal de funcionários públicos: somados remuneração, subsídios e outras vantagens, o valor não pode extrapolar o salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
É o chamado teto constitucional, hoje fixado em R$ 46.366,19. Não se pode dizer que seja uma cifra pequena na realidade brasileira; ela equivale a mais de 30 vezes o salário mínimo nacional.
À luz dessa regra, o caso sergipano é simples: assumindo a hipótese ingênua de que o adicional de fato deva ser pago, a remuneração mensal dos beneficiados poderia aumentar apenas até o limite do teto. E ponto final.
Campbell Marques, no entanto, entendeu de outra forma. Na sua visão, o valor extra pode chegar a R$ 46.366,19 além do próprio limite de R$ 46.366,19. Em outras palavras, o ministro estabeleceu um novo teto de R$ 92.732,38.
Por mais que ele escreva em sua decisão que o entendimento se aplica somente à situação particular dos magistrados sergipanos, é evidente que, quando outros membros do sistema de Justiça quiserem furar o teto, a canetada do corregedor nacional poderá servir de parâmetro.
A iniciativa de Campbell Marques torna-se ainda mais estranha quando se lembra que ele nem tem competência para arbitrar um novo teto. Ou seja, ainda que o limite proposto fizesse sentido, e não faz, não caberia a ele essa decisão, e sim ao Congresso Nacional, por meio de uma emenda à Constituição.
Deputados e senadores sempre poderão argumentar que a Carta Magna já é clara o suficiente nesse ponto —e terão razão. Mas, dados os abusos reiterados, viria a calhar um basta definitivo na farra dos supersalários.