17 mar 2025, seg

O erro do jornal Washington Post – 01/03/2025 – Opinião

Durante a primeira administração de Donald Trump, o jornal Washington Post adotou uma célebre campanha publicitária centrada no slogan “A democracia morre no escuro”. A ideia era acentuar o papel da imprensa profissional como instituição vocacionada para fiscalizar os poderosos e assim dificultar os desvios autoritários.

Quatro anos se passaram, o republicano voltou à Casa Branca, e alguns princípios editoriais agora adotados pela publicação fundada em 1877 levariam um desavisado a se perguntar se se trata do mesmo jornal e do mesmo proprietário. A resposta é afirmativa.

Jeff Bezos, o fundador da Amazon que comprou o Post em 2013, divulgou sua decisão de doravante publicar nas páginas de opinião do jornal apenas artigos de convidados que defendam as liberdades individuais e econômicas. Ele julga que a internet e as redes sociais cumprem o papel de oferecer visões variadas, e seu veículo pode se desincumbir disso.

Indagado por Bezos sobre se abraçaria a nova orientação com convicção, o jornalista responsável pela curadoria dos artigos preferiu deixar o Washington Post.

Bezos, que neste mandato de Trump se aproximou do presidente republicano, entende que cumpre uma missão patriótica ao determinar a reserva de mercado de opiniões em seu jornal. Se a sociedade norte-americana atingiu graus de desenvolvimento excepcionais, foi por abraçar essas ideias, argumenta o empresário.

Ora, mas o regime das liberdades individuais pressupõe a livre circulação de ideias e a máxima tolerância a opiniões contrárias. Os veículos que, como esta Folha, encampam o ideário liberal nos costumes e na economia adotam, como decorrência lógica disso, a promoção do pluralismo em suas páginas de opinião.

Nada mais estranho à tradição que inspirou as publicações de maior prestígio no mundo do que transformar uma praça pública de debates abertos num condomínio fechado em que apenas se reafirmam as mesmas ideias.

Ao contrário do que diz Bezos, a internet e as redes sociais são os locais em que as bolhas de opinião se reforçam, em que o ódio ao diferente se cultiva. Jornais de inclinação liberal deveriam operar na lógica contrária, da abertura. Deveriam expor seus leitores a perspectivas diferentes das com que estão habituados.

Já se disse com propriedade que um bom jornal é onde a nação conversa consigo mesma. Expulsar uma parte relevante da opinião pública dessa conversa, e ainda fazê-lo a pretexto de exercer o nacionalismo, fará do Washington Post um jornal pior.

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