18 mar 2025, ter

O futuro é promissor (desde que haja regras) – 05/03/2025 – Opinião

Depois de uma semana excepcional, em que o Brasil fervilhou com a conquista do nosso primeiro Oscar em pleno Carnaval, embarco para uma imersão no mínimo instigante no maior festival de inovação do planeta.

Ainda emocionada com a consagração de Fernanda Torres em Hollywood, me retiro para uma espécie de universo paralelo para ser “speaker” no SXSW (South by Southwest), evento anual que será realizado de sexta-feira (7) a 15 de março em Austin, capital do Texas (EUA) —indispensável para quem se interessa pelos novos rumos da tecnologia, da cultura e do entretenimento.

Sinto-me como se estivesse entrando em outra dimensão, onde temas como as primeiras experiências vitoriosas em teletransporte por meio da computação quântica se misturam às projeções de um cenário espantoso: a expectativa de 35 milhões de robôs humanoides inseridos apenas na sociedade chinesa nos próximos cinco anos. Isso sem falar nos carros voadores, exoesqueletos e outras inovações futuristas.

No ano passado, estive neste mesmo evento como correspondente da Folha, escrevendo sobre anéis que monitoram nossos sistemas cardiovasculares, diagnósticos de distúrbios psíquicos revelados em minutos por meio da gamificação e aparelhos fabulosos que prometem revolucionar o dia a dia da população.

Confesso que, além da euforia diante dessas possibilidades inimagináveis, voltei preocupada com a defasagem acachapante que se configura no Brasil. Enquanto os países ricos investem pesado e avançam vertiginosamente no domínio da tecnologia, seguimos relegados ao segundo plano, com os índices de analfabetismo digital crescendo a cada dia.

Neste ano, minha preocupação é outra. Num cenário em que a inteligência artificial (IA) dará vida a robôs humanoides com autonomia para tomar decisões de forma independente —sem que seus programadores possam ter total controle da situação—, que tipo de regulamentação está sendo criada para mediar nosso relacionamento com as máquinas?

Se sua atuação estivesse restrita a funções como aspirar pó e outras tarefas inglórias do cotidiano, ok. Mas espera-se que assumam os papéis de babás, cuidadores de idosos e até professores! Estou apreensiva, para não dizer apavorada. Imagens recentes de um robô humanoide atacando uma pessoa na tentativa de conter uma multidão na China deram um vislumbre do que pode acontecer. O que será de nós se tivermos que nos defender da força física de um corpo feito de titânio, aço ou fibra de carbono?

E se a briga for parar na Justiça, o que dirão os juízes?


Quando Walter Moreira Salles comentou sobre seu feito inédito de trazer um Oscar para o Brasil e as possíveis repercussões positivas para a nossa indústria cinematográfica, ressaltou a urgência da regulamentação dos streamings. É inadmissível que gigantes como Netflix, Amazon e Max, acostumados a pagar caro por sua incursão em mercados internacionais, continuem operando impunemente por aqui, sem qualquer contrapartida.

Minha participação no SXSW abordará temas macro como esses. Fui convidada para integrar a “Health and Medtech Track” e estou muito agradecida pela oportunidade de falar sobre a necessidade de encarar a saúde mental sob uma perspectiva coletiva.

Quero lembrar a todos que agir de forma responsável, sempre levando em conta a repercussão coletiva de qualquer ato —seja ele praticado por uma pessoa, uma corporação ou um robô humanoide—, é a única saída para nos prepararmos para a distopia que se insinua no horizonte.

TENDÊNCIAS / DEBATES

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