Era uma piada corrente em 1985. Dizia-se que, ao ser efetivado pelo presidente José Sarney no recém-criado Ministério da Cultura, o deputado mineiro José Aparecido de Oliveira cruzou em Brasília com seu velho amigo, o jornalista Hermano Alves. Ao vê-lo, Hermano abraçou-o com efusão: “Parabéns, Zé, pela nomeação para a Cultura! Você precisa ler um livro!”. Zé Aparecido: “Ah, é? Qual?”. E o terrível Hermano: “Qualquer um!”.
Margareth Menezes, titular do hoje chamado MinC, declarou há pouco, nos 40 anos da redemocratização, que o ministério foi “o resultado da intensa mobilização de artistas, intelectuais e movimentos culturais”. É bonito, mas não foi bem assim. Em 1985, depois de 21 anos de ditadura, censura, prisões, tortura e exílios, havia, de fato, “intensa mobilização”, mas pela volta das eleições diretas e das liberdades básicas. Não em particular pela criação de um ministério.
Zé Aparecido, 55 anos, era bom sujeito, leal, ético, incorruptível, muito afável e algo ingênuo. Fizera sua carreira política à sombra de Jânio Quadros, Magalhães Pinto e Tancredo Neves e fora cassado em 1964. Anistiado e de volta à política, ajudara Tancredo a derrotar Paulo Maluf no Colégio Eleitoral e, como tal, precisavam dar-lhe um ministério. Mas qual? Na dúvida sobre suas aptidões, criaram para ele o da Cultura, inspirado no da França, comandado pelo popular Jack Lang.
Nem todos aprovaram a ideia. Aqui mesmo na Folha (“O fantasma da ópera ministerial”), ouvi de gente insuspeita como Antonio Callado, Haroldo de Campos, Octavio Ianni e Florestan Fernandes o temor de um possível dirigismo cultural. O Brasil saía de uma ditadura e era uma preocupação justa. Com absoluta fome de liberdade, ninguém queria tutores, tutelas, “diretrizes”.
O dirigismo aconteceu —não o político que se temia, mas o econômico. Por um lado foi bom, com a implantação da Lei Rouanet e de outras medidas. Por outro, nem tanto —porque a cultura, agora dependente e sem confiança, não pode mais passar sem um MinC.