16 mar 2025, dom

Recorde de receita não vem sem embaraços para o governo – 28/01/2025 – Opinião

Fossem outras as circunstâncias, o recorde de arrecadação tributária contabilizado em 2024 seria lido como uma vitória do ministro Fernando Haddad, da Fazenda, e sua equipe, que tiveram sucesso considerável no esforço de buscar mais receitas. No atual contexto, porém, o resultado não vem sem embaraços para o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Os números impressionam. Em valores corrigidos pela inflação, a União coletou R$ 2,709 trilhões em impostos, contribuições, taxas, royalties e outras fontes, um salto de 9,6% —ou R$ 238 bilhões, suficientes para pagar quase um ano e meio de Bolsa Família— em relação ao ano anterior.

Maior da história em termos reais, a arrecadação foi equivalente a 22,46% do Produto Interno Bruto estimado, patamar que só havia sido atingido ou superado em alguns momentos da primeira década do século, quando o país vivia um momento excepcional devido ao boom global de preços de produtos primários.

Parcela importante da melhora pode ser atribuída ao crescimento da economia, que superou as expectativas iniciais e se aproximou dos 3,5%. Mas foram decisivas, de fato, as providências destinadas a reduzir benefícios e elevar a tributação.

Por esse aspecto, o recorde é divulgado em momento politicamente delicado para o governo Lula, ainda às voltas com a péssima repercussão de uma medida para elevar o controle de transações por meio do Pix —que suscitou a informação falsa de que o instrumento seria taxado e a percepção plausível de que o governo federal buscava elevar receitas com fiscalização.

Mais grave, a cifra excepcional escancara o fracasso da estratégia petista de equilibrar o Orçamento exclusivamente com o aumento de receitas, sem conter a alta contínua das despesas.

Afinal, nem a arrecadação histórica bastou para cobrir os gastos com pessoal, custeio administrativo, programas sociais e investimentos. O Tesouro Nacional deve apurar um déficit primário (excluindo encargos com juros da dívida) perto dos R$ 40 bilhões no ano passado.

Daqui para a frente, o cenário deve ser bem mais difícil. Algumas das receitas de 2024 tiveram caráter extraordinário e devem se reduzir; a busca de mais recursos será obstruída pela campanha da oposição à direita contra a sanha arrecadatória de Lula; a disparada dos juros, consequência da gastança, tende a limitar a expansão da economia.

Com a alta das taxas dos títulos públicos, ademais, o governo federal precisará buscar superávits maiores para conter a escalada de sua dívida.

É correta e justa a estratégia de rever privilégios tributários para setores influentes —multiplicados, aliás, em gestões petistas anteriores. É ilusório, porém, imaginar que elevar uma carga já excessiva resolverá o grave desequilíbrio das contas do Tesouro. A arrecadação precisa ser mais bem distribuída, não maior.

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