Ainda não tenho a piada pronta, mas explico: uma coisa é esbravejar. Outra é ter poder para cumprir ameaças. Assim, é preciso deixar claro que não haverá, até a eleição de 2028, um processo de impeachment contra um juiz federal americano, especificamente o juiz James Boasberg, no momento sendo desafiado e xingado coletivamente por Donald Trump e seu gabinete por questionar a autoridade do Poder Executivo no voo dos venezuelanos deportados.
Não há 67 votos no Senado para remover um juiz vitalício de seu tribunal. De fato, com a apertada maioria de deputados republicanos, o presidente da Câmara, Mike Johnson, estaria cometendo suicídio político se enfiasse o pé na jaca com uma aventura de impeachment.
O problema de um regime que segue a palavra de ordem do porcino Steve Bannon —”invadir a área com merda”— para manter a oposição zonza porque, segundo ele, a mídia é o inimigo, é que não se trata de convencimento e sim de desorientação.
Já que vai ter tempo livre de sobra, o deputado fujão Zero Três estaria aberto a sugestões de leitura para aprimorar suas cultas credenciais como fritador de hambúrgueres? Quem sabe, ele pode se identificar como o Oblomov brasileiro, o filhinho de papai que nada faz e choraminga quando enfrenta a realidade, imortalizado no romance homônimo de Ivan Gontcharov.
Quando não estiver conspirando contra a nossa soberania nacional, o deslumbrado rebento conhecido pela bravata “se quiser fechar o STF, você não manda nem um jipe, cara, manda um soldado e um cabo” pode ir a uma biblioteca se informar melhor sobre a história do país onde sempre sonhou viver.
Certamente, há de escapar ao parlamentar gazeteiro a ironia de ter explicado sua fuga no mesmo dia em que o presidente da Suprema Corte americana deu uma cotovelada na Casa Branca com esta declaração: “Por mais de dois séculos, ficou estabelecido que o impeachment não é uma resposta apropriada para desacordos sobre uma decisão judicial.”
O juiz John Roberts, um silencioso conservador e autor da decisão à qual este país deve a garantia de impunidade para ocupantes da Casa Branca, só havia puxado a orelha de Trump uma vez, em 2018, também num caso de imigração, quando o presidente xingou um magistrado que o contrariou de “juiz de Obama.” Ele reagiu para defender a independência de seus pares, afirmando que juiz não tem dono.
Na terça-feira (18), a curta declaração de Roberts sobre os “dois séculos” foi uma referência direta ao ano de 1805, quando o barulhento e partidário juiz da Suprema Corte Samuel Chase foi absolvido de um processo de impeachment iniciado na Câmara e orquestrado pelo presidente Thomas Jefferson. O presidente da corte naquele ano, um forte opositor do impeachment, era o juiz John Marshall, herói de John Roberts. Marshall entrou para a história como um grande defensor da independência do Judiciário e da separação entre os três Poderes.
Assim como não compreende a distinção entre grelhar e fritar a carne do sanduíche inventado na pátria à qual dedica sua lealdade, o ocioso herdeiro produzido pela Barra da Tijuca parece achar que os três Poderes devem formar uma bacanal de fidelidade ao papai. Se depender do juiz Roberts, ele vai ter a chance de avançar na sua educação.